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1. Lula na ONU: “Única guerra de que todos podem sair vencedores é contra a fome e a pobreza”
Lula sobre a ONU: 'Nossa missão histórica é a de torná-la novamente portadora de esperança e promotora da igualdade, da paz, do desenvolvimento sustentável, da diversidade e da tolerância'. Foto: Ricardo Stuckert / PR
Ao dirigir-se a líderes de todo o planeta nesta terça-feira, 23 de setembro, na abertura da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reafirmou que a soberania do Brasil é inegociável. O líder brasileiro posicionou-se na defesa dos valores democráticos, da importância do multilateralismo, dos preceitos que regem o desenvolvimento sustentável e do combate à mudança do clima. E destacou a necessidade de o mundo se unir em prol da paz e do combate à pobreza.
» Confira a íntegra do discurso do presidente Lula na ONU
Ao lembrar que neste ano o Brasil voltou a sair do Mapa da Fome, Lula pontuou que muitas nações ainda padecem deste mal. “No mundo, há 670 milhões de pessoas famintas. A única guerra de que todos podem sair vencedores é a que travamos contra a fome e a pobreza. Esse é o objetivo da Aliança Global que lançamos no G20, que já conta com o apoio de 103 países”.
Aplaudido em diversos trechos de sua fala de 15 minutos, Lula alertou que a pobreza é também campo fértil para os que tentam solapar valores democráticos. “Seu vigor pressupõe a redução de desigualdades e a garantia dos direitos mais elementares: a alimentação, a segurança, o trabalho, a moradia, a educação e a saúde. A democracia falha quando mulheres ganham menos que os homens ou morrem pelas mãos de parceiros. Perde quando fecha portas e culpa migrantes pelas mazelas do mundo. A pobreza é tão inimiga da democracia quanto o extremismo”, alegou o líder brasileiro.
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PRIORIDADES – Para Lula, é essencial que a comunidade internacional reveja prioridades e que o mundo reduza gastos com guerras e amplie a ajuda à inclusão social. Defendeu a necessidade do alívio de pagamento do serviço da dívida externa de países mais pobres, sobretudo os africanos, e a definição de padrões mínimos de tributação global, para que os super-ricos paguem mais impostos que os trabalhadores.
PRIMEIRO – Como é tradição desde 1955, o Brasil foi o primeiro Estado-membro a discursar na abertura da Assembleia Geral da ONU. Lula abriu os discursos de chefes-de-estado e falou logo depois do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e da presidenta da 80ª Assembleia Geral, a alemã Annalena Baerbock. Lula ressaltou que os países devem unir-se para fortalecer a ONU num momento que definiu como de incertezas: “Nossa missão histórica é a de torná-la novamente portadora de esperança e promotora da igualdade, da paz, do desenvolvimento sustentável, da diversidade e da tolerância”, afirmou.
SEM OMISSÃO – Para Lula, existe um evidente paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento das democracias. “O autoritarismo se fortalece quando nos omitimos frente a arbitrariedades. Quando a sociedade internacional vacila na defesa da paz, da soberania e do direito, as consequências são trágicas. Mesmo sob ataque sem precedentes, o Brasil optou por resistir e defender sua democracia, reconquistada há 40 anos pelo seu povo, depois de duas décadas de governos ditatoriais. Não há justificativa para as medidas unilaterais e arbitrárias contra nossas instituições e nossa economia”, destacou o presidente brasileiro.
SOBERANIA – Lula exaltou também o funcionamento das instituições brasileiras, que foram capazes de atuar com de forma independente no julgamento dos que atentaram contra o Estado de direito. “Diante dos olhos do mundo, o Brasil deu um recado a todos os candidatos a autocratas e àqueles que os apoiam: nossa democracia e nossa soberania são inegociáveis. Seguiremos como nação independente e como povo livre de qualquer tipo de tutela”, afirmou Lula.
COMÉRCIO E OMC – O presidente brasileiro também fez um alerta relativo ao momento turbulento enfrentado pelo comércio internacional. “Poucas áreas retrocederam tanto como o sistema multilateral de comércio. Medidas unilaterais transformam em letra morta princípios basilares como a cláusula de Nação Mais Favorecida. Desorganizam cadeias de valor e lançam a economia mundial em uma espiral perniciosa de preços altos e estagnação. É urgente refundar a OMC em bases modernas e flexíveis”, conclamou Lula.
PLATAFORMAS DIGITAIS – Outro ponto destacado pelo presidente foram as plataformas digitais. Lula ressaltou que, embora sejam capazes de aproximar as pessoas como nunca na história da humanidade, elas não podem ser terra sem lei, uma vez que em muitas ocasiões têm sido usadas para propagar intolerância, misoginia, xenofobia e desinformação. “Cabe ao poder público proteger os mais vulneráveis. Regular não é restringir a liberdade de expressão. É garantir que o que já é ilegal no mundo real seja tratado assim no ambiente virtual”, afirmou Lula.
AMERICA LATINA – Ao referir-se à América Latina, Lula disse que o caminho para o combate ao crime organizado passa pela cooperação e pediu que o diálogo prevaleça nas questões ligadas à Venezuela, além de se posicionar contrário à classificação de Cuba como um país que patrocina o terrorismo. “A forma mais eficaz de combater o tráfico de drogas é a cooperação para reprimir a lavagem de dinheiro e limitar o comércio de armas. A via do diálogo não deve estar fechada na Venezuela. O Haiti tem direito a um futuro livre de violência. E é inadmissível que Cuba seja listada como país que patrocina terrorismo”.
GAZA – O presidente também tratou dos conflitos em curso em Gaza: “O povo palestino corre o risco de desaparecer. Só sobreviverá com um Estado independente e integrado à comunidade internacional. Esta é a solução defendida por mais de 150 membros da ONU, reafirmada ontem (22/9), aqui neste mesmo plenário, mas obstruída por um único veto. Esse massacre não aconteceria sem a cumplicidade dos que poderiam evitá-lo”. Lula ainda criticou o fato de o presidente do Estado da Palestina não ter sido autorizado a participar do evento na ONU. “É lamentável que o presidente Mahmoud Abbas tenha sido impedido pelo país anfitrião de ocupar a bancada da Palestina nesse momento histórico”.
UCRÂNIA – Em relação à guerra na Ucrânia, Lula disse que é preciso buscar um acordo o quanto antes. “No conflito na Ucrânia, todos já sabemos que não haverá solução militar. É preciso pavimentar caminhos para uma solução realista. Isso implica levar em conta as legítimas preocupações de segurança de todas as partes”.
MUJICA E PAPA FRANCISCO – Ao concluir o discurso, Lula fez questão de lembrar duas personalidades que partiram em 2025: “Este ano, o mundo perdeu duas personalidades excepcionais: o ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, e o Papa Francisco. Ambos encarnaram como ninguém os melhores valores humanistas. Suas vidas se entrelaçaram com as oito décadas de existência da ONU”.
ESCOLHAS – Segundo Lula, se ambos estivessem aqui, teriam defendido que o autoritarismo, a degradação ambiental e a desigualdade não são inexoráveis; que os únicos derrotados são os que cruzam os braços, resignados; que o mundo pode vencer os falsos profetas e oligarcas que exploram o medo e monetizam o ódio; e que o amanhã é feito de escolhas diárias e é preciso coragem de agir para transformá-lo. “No futuro que o Brasil vislumbra não há espaço para a reedição de rivalidades ideológicas ou esferas de influência. A confrontação não é inevitável”, afirmou o presidente do Brasil.
80ª AGNU – A 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas marca os 80 anos de fundação da ONU, criada em 1945 com a assinatura da Carta de São Francisco. O Brasil foi um dos 51 signatários originais. A criação da ONU representou não apenas o fim da Segunda Guerra Mundial, mas o compromisso da comunidade internacional com a paz, os direitos humanos, a igualdade soberana entre os Estados e o desenvolvimento sustentável. Atualmente, a organização reúne 193 Estados-membros e dois Estados observadores: a Palestina e a Santa Sé. O tema da 80ª sessão é “Melhor Juntos: 80 anos e mais para paz, desenvolvimento e direitos humanos”.
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