Nos últimos seis meses, a administração municipal tem protagonizado uma sucessão de acordos de Não Persecução Cível que, embora possam estar dentro da legalidade, levantam sérias questões morais e éticas. O prefeito, a primeira-dama e diversos servidores têm se beneficiado dessa prática, criando a sensação de que a impunidade se tornou a norma na gestão pública.
Os acordos de Não Persecução Cível foram concebidos para serem um mecanismo alternativo de resolução de conflitos, evitando processos demorados e onerosos. No entanto, o que se vê na atual conjuntura é uma banalização desse instrumento, usado repetidamente por quem deveria zelar pela moralidade administrativa. Em vez de enfrentarem as consequências de suas ações, autoridades municipais recorrem sistematicamente a esses acordos, escapando de sanções mais severas e perpetuando a ideia de que a lei pode ser contornada com simples ajustes de gabinete.
A sociedade precisa questionar: até que ponto essa prática se justifica? Se o gestor público reincide constantemente em condutas que levam à necessidade de firmar esses acordos, não estaria ele, na realidade, demonstrando sua inaptidão para o cargo? O uso recorrente desse expediente gera um perigoso precedente e enfraquece o já combalido senso de justiça na esfera pública.
Questionamentos ao Ministério Público:
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Diante da recorrência dos acordos de Não Persecução Cível envolvendo a administração municipal, quais critérios o Ministério Público tem adotado para avaliar a pertinência e a proporcionalidade desses ajustes?
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Há algum mecanismo de controle para evitar que tais acordos se tornem uma ferramenta de impunidade, permitindo que agentes públicos reincidentes escapem de punições mais severas?
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Como o MP justifica a viabilidade ética e moral da reiterada utilização desses acordos por autoridades que deveriam zelar pela moralidade administrativa?
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Existe algum estudo ou levantamento sobre a quantidade de acordos de Não Persecução Cível firmados no município em comparação com outras localidades, para verificar se há um uso excessivo dessa prática?
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Em casos de reincidência, o MP considera a possibilidade de medidas mais rigorosas, como ações civis públicas, afastamento dos agentes públicos envolvidos ou, até mesmo, pedidos de improbidade administrativa?
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O Ministério Público tem atuado de forma proativa para garantir que esses acordos não sejam utilizados como uma forma de proteção para gestores ineptos e desonestos?
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Considerando que a moralidade administrativa é um princípio constitucional, o MP não considera que o uso excessivo desses acordos pode violar esse princípio e, consequentemente, comprometer sua própria função fiscalizadora?
A legalidade não pode ser utilizada como um escudo para a imoralidade. O poder público deve satisfação à sociedade, e essa satisfação não pode vir na forma de medidas paliativas que simplesmente apagam rastros de irregularidades sem punição efetiva. É preciso que os órgãos de controle e a população estejam atentos a esse abuso, exigindo transparência e responsabilidade de seus governantes.
A corrupção e a má gestão não se combatem com conchavos e acertos de contas nos bastidores. Se há reiteradas infrações que demandam acordos de Não Persecução Cível, talvez a solução não seja apenas renegociar penalidades, mas sim promover uma mudança real na condução da administração pública. A justiça não pode ser apenas um jogo de conveniências.
A banalização dos acordos de Não Persecução Cível compromete a credibilidade não apenas do Ministério Público, mas de todo o sistema de Justiça. Quando tais instrumentos são utilizados repetidamente para encobrir irregularidades e evitar punições mais severas, a percepção pública é de que o MP, em vez de fiscalizar e combater atos ilícitos, acaba legitimando um mecanismo de impunidade institucionalizada.
Esse cenário coloca em descrédito a própria função do Ministério Público como guardião da moralidade e do interesse público, uma vez que, ao permitir sucessivos acordos sem consequências efetivas, a instituição passa a ser vista como conivente com os desvios da administração. Além disso, o excesso na utilização desses acordos fragiliza a confiança da sociedade no Poder Judiciário, pois transmite a mensagem de que a justiça se tornou um jogo de conveniências, acessível apenas àqueles que detêm poder político e influência.
A legalidade, por si só, não pode ser um escudo para práticas imorais. O compromisso com a ética e a transparência deve prevalecer sobre a mera formalidade dos acordos, sob pena de minar a própria razão de ser das instituições que deveriam proteger os interesses coletivos. Se o Ministério Público e o Judiciário não impõem limites a essa prática, correm o risco de se tornarem agentes passivos de um sistema onde a impunidade é normalizada e a justiça, desmoralizada.